Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Lucian Blaga - Conclusão

Aparentemente, Blaga metaforiza a etapa final da vida – talvez de sua própria vida –, neste enredo terreno que se conta mediante um livro, cujas últimas palavras estão por ser gravadas, e a obra cerrada para nela nada mais se agregar, pois o autor fechará as suas portas, levando consigo as chaves.

É uma poesia transposta por certa sensibilidade metafísica, modelada em forma de desalento por alguém que, mais à frente, nada contempla a não ser o isolamento cósmico do ser humano e o devastador império do tempo – esse exterminador de qualquer pretensão de eternidade!

J.A.R. – H.C.

Lucian Blaga
(1895-1961)

Încheiere

Frate, o boală învinsă ţi se pare orice carte.
Dar cel ce ţi-a vorbit e în pământ.
E în apă. E în vânt.
Sau mai departe.

Cu foaia această închid porţile şi trag cheile.
Sunt undeva jos sau undeva sus.
Tu stinge-ţi lumânarea şi-ntreabă-te:
taina trăită unde s-a dus?

Ţi-a mai rămas în urechi vreun cuvânt?
De la basmul sângelui spus
întoarce-ţi sufletul către perete
şi lacrima către apus.

(1929)

Velho lendo livro
(Alfred P. J. Jeanmougin: pintor francês)

Conclusão

Irmão, julgas todo livro uma doença finda.
Mas quem te falou está na terra.
Na água se abriga. No vento se encerra,
Ou mais longe ainda.

Com esta página fecho as portas e levo a chave.
Estou acima, abaixo, ali ou lá.
Tu, apaga a vela e pergunta, suave:
O mistério vivido onde está?

Restou-te no ouvido alguma palavra?
Da lenda do sangue exposto
Desvia a alma para a parede
E chora para o sol posto.

(1929)

Referência:

BLAGA, Lucian. Încheiere / Conclusão. Tradução de Caetano Waldrigues Galindo. In: __________. A grande travessia. Seleção, tradução e introdução de Caetano Waldrigues Galindo. Brasília, DF: Editora da UnB, 2005. Em romeno: p. 108; em português: p. 109. (Coleção ‘Poetas do Mundo’)

domingo, 30 de julho de 2017

Mia Couto - Ânsia

É sobre a ânsia de não cair na letargia, prima-irmã da morte – ainda que metafórica –, que o poeta moçambicano joga todas as suas fichas: quer ele manter-se nas grimpas das ocorrências, que como ondas do mar, arremetem até as praias em cujas águas nos banhamos.

E o faz para manter-se vivo, fluindo no domínio do tempo e do espaço, sabedor de que subsistir é sempre fenecer aos poucos, quer na carne quer no espírito, motivo por que necessitamos substituí-los de tempos em tempos, renová-los por iteração, ressuscitando-os em nossos sonhos mais diletos.

J.A.R. – H.C.

Mia Couto
(n. 1955)

Ânsia

Não me deixem tranquilo
não me guardem sossego
eu quero a ânsia da onda
o eterno rebentar da espuma

As horas são-me escassas:
dai-me o tempo
ainda que o não mereça
que eu quero
ter outra vez
idades que nunca tive
para ser sempre
eu e a vida
nesta dança desencontrada
como se de corpos
tivéssemos trocado
para morrer vivendo

Em: “Raiz de orvalho e outros poemas”

Ilusão de Ótica nº 8: duas pinturas em uma
(Oleg I. Shuplyak: artista ucraniano)

Referência:

COUTO, Mia. Ânsia. In: __________. Poemas escolhidos. Seleção do autor. Apresentação de José Castello. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2016. p. 105.

sábado, 29 de julho de 2017

Patrick Kavanagh - Lembrança de Meu Pai

Mais um poeta desamparado pela perda de um ente querido (rs): o irlandês Kavanagh caminha pelos logradouros da cidade, e em todos os homens de idade avançada vê a figura de seu próprio pai, já ausente.

É um estado mental que revela a não assimilação completa do fenômeno da perda, a morte como experiência capaz de provocar ranhuras indeléveis no espírito de quem ficou: faz ou não lembrar o eloquente exemplo da letra de “Canção da América” (1980), de Milton Nascimento e Fernando Brant?!

J.A.R. – H.C.

Patrick Kavanagh
(1904-1967)

Memory of My Father

Every old man I see
Reminds me of my father
When he had fallen in love with death
One time when sheaves were gathered.

That man I saw in Gardiner Street
Stumble on the kerb was one,
He stared at me half-eyed,
I might have been his son.

And I remember the musician
Faltering over his fiddle
In Bayswater, London,
He too set me the riddle.

Every old man I see
In October-coloured weather
Seems to say to me:
“I was once your father”.

Ancião com uma corrente de ouro
(Rembrandt: pintor holandês)

Lembrança de Meu Pai

Cada velho que vejo
Faz-me lembrar de meu pai
Quando se afeiçoou pela morte
Certa vez quando se recolhiam as gavelas.

Aquele homem que vi em Gardner Street
A tropeçar no meio-fio era um deles,
Olhou-me com olhos semicerrados;
Eu poderia ter sido seu filho.

E me recordo do músico
Vacilante sobre o seu violino
Em Bayswater, Londres;
Ele também me impôs o enigma.

Cada velho que vejo
No tempo colorido de outubro
Parece me dizer:
“Uma vez já fui seu pai”.

Canção da América
Álbum: Sentinela (1980)
(Milton Nascimento e Fernando Brant)

Referência:

KAVANAGH, Patrick. Memory of my father. In: BENSON, Gerard; CHERNAIK, Judith; HERBERT, Cicely (Eds.). Best ‎‎poems on the underground. 1st. publ. London, EN: Weidenfeld & Nicolson, ‎‎2009. p. 146.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Georg Trakl - Canto do desterrado

Com toda a sua aura obscura, carregada de tons frementes e às vezes insólitos – algo tão característico de grande parte das criações do expressionismo em língua alemã –, Trakl sabe como arranjar as palavras para formar um conjunto caleidoscópico de símbolos em sua perspectiva dos desterrados, conferindo um melancólico efeito.

Por trás de seu manifesto verniz enigmático, o poema deixa transparecer a visão de um poeta que experimenta contratempos em um mundo envelhecido, do qual muitos foram sacados ou partiram para nunca mais voltar, mas que ainda é capaz de revelar laivos de harmonia e de beleza, apontando para o futuro.

J.A.R. – H.C.

Georg Trakl
(1887-1914)

Gesang des Abgeschiedenen
An Karl Borromäus Heinrich
(1914)

Voll Harmonien ist der Flug der Vögel. Es haben die grünen Wälder
Am Abend sich zu stilleren Hütten versammelt;
Die kristallenen Weiden des Rehs.
Dunkles besänftigt des Plätschern des Bachs, die feuchten Schatten

Und die Blumen des Sommers, die schön in Winde läuten.
Schon dämmert die Stirne dem sinnenden Menschen.  

Und es leuchtet ein Lämpchen, das Gute, in seinem Herzen
Und der Frieden des Mahls; denn geheiligt ist Brot und Wein
Von Gottes Händen, und es schaut aus nächtigen Augen
Stille dich der Bruder an, daß er ruhe von dorniger Wanderschaft.
O das Wohnen in der beseelten Bläue der Nacht.

Liebend auch umfängt das Schweigen im Zimmer die Schatten
der Alten,
Die purpurnen Martern, Klage eines großen Geschlechts,
Das fromm nun hingeht im einsamen Enkel.

Denn strahlender immer erwacht aus schwarzen Minuten
des Wahnsinns
Der Duldende an versteinerter Schwelle
Und es umfängt ihn gewaltig die kühle Bläue und dieleuchtende
Neige des Herbstes,

Das stille Haus und die Sagen des Waldes,
Maß und Gesetz und die mondenen Pfade der Abgeschiedenen.

Exilados
(Patrick Hennessy: pintor irlandês)

Canto do desterrado
A Karl Borromäus Heinrich
(1914)

Pleno de harmonias é o voo dos pássaros. As florestas verdes
Reuniram-se à noite em cabanas mais tranquilas;
Os pastos cristalinos da corça.
Escuridão suaviza o murmúrio do riacho, as sombras úmidas

E as flores do verão, que soam belas ao vento.
Já crepuscula na fronte do pensativo homem.

E brilha uma luzinha, a da bondade, em seu coração,
E a paz da ceia; pois, santificados são pão e vinho
Pelas mãos de Deus, e com olhos noturnos o irmão
Contempla-te silencioso, repousando de espinhosa caminhada.
Ah, morar no vivo azul da noite.

Também amando o silêncio envolve no quarto as sombras dos
ancestrais,
Os purpúreos martírios, lamento de toda uma geração,
Que agora se vai piedosa no neto solitário.

Cada vez mais radiante desperta sempre dos negros minutos
de loucura
O paciente em soleira petrificada
E envolve-o violentamente o frescor azulado e o cintilante resto
do outono,

A casa tranquila e as lendas da floresta,
Medida e lei, e os lunares atalhos dos desterrados.

Referência:

TRAKL, Georg. Gesang des abgeschiedenen / Canção do desterrado.Tradução de Claudia Cavalcanti. In: BECHER, Johannes R. et al. Poesia expressionista alemã: uma antologia. Organização e tradução de Claudia Cavalcanti. Edição bilíngue ilustrada. São Paulo, SP: Estação Liberdade, 2000. Em alemão: p. 208; em português: p. 209.

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Henrique do Cêrro Azul - O Sonho

Mais um achado pelas vias de Brasília, de onde extraí este belo soneto, dentre tantos que constam na obra em referência, maravilhosamente composta por este cearense de origem, que se radicou em Brasília, onde veio a se tornar Subprocurador-Geral da República.

Como se costuma dizer, morro e não vejo tudo: perpassados pelo lastro parnasiano, os poemas de Cêrro Azul revelam um poeta seguro das técnicas clássicas de criação, a enunciar os seus melhores argumentos em relação ao amor, às circunstâncias da vida, à natureza e aos seus vastos mistérios.

J.A.R. – H.C.

Henrique do Cêrro Azul
(1936-2015)

O Sonho

Gozar a vida? Só por intermédio
Do sonho. O gozo, no correr dos dias,
Todas as ilusões e as alegrias
Tornam-se tema para um epicédio...

Só o sonho é que serve de remédio
A tão grandes e tantas nostalgias,
Pois em meio de mágoas tão sombrias
Ate o próprio amor nos causa tédio.

O sonho, não! O sonho não nos cansa!
Bendita, pois, a mística esperança
E todo aquele que consegue tê-Ia...

Pois é o sonho que faz, bendito engano!
A gota d’água se julgar oceano
E o pirilampo se julgar estrela.

O sonho
(Pablo Picasso: artista espanhol)

Elucidário:

Epicédio: Discurso ou poema recitado em memória de pessoa notável.

Referência:

AZUL, Henrique do Cêrro. O sonho. In: __________. Sonetos e poemas. Brasília, DF: Ebrasa - Editora de Brasília S.A., 1967. p. 56.

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Thom Gunn - O Alento

Sonhar com pessoas que já partiram é um de nossos sonhos mais comuns. Talvez seja o natural lenitivo para que possamos melhor nos conformar com a ruptura dos relacionamentos, em especial com as pessoas que nos eram mais caras.

É sobre esse tema que o poema de hoje trata: uma faceta da condição humana, a finitude, incômoda para quem fica; ‘in dubio pro mortuus’, pois não se conhecem as circunstâncias a que exposto no além; matéria suficientemente complexa para ser examinada por um pesquisador freudiano!

J.A.R. – H.C.

Thom Gunn
(1929-2004)

The Reassurance

About ten days or so
After we saw you dead
You came back in a dream.
I’m alright now you said.

And it was you, although
You were fleshed out again:
You hugged us all round then,
And gave your welcoming beam.

How like you to be so kind,
Seeking to reassure.
And, yes, how like my mind
To make itself secure.

O Anjo da Morte
(Evelyn De Morgan: pintora inglesa)

O Alento

Uns dez dias mais ou menos
Depois que vieste a falecer
Retornaste em um sonho.
“Estou bem agora”, disseste.

E eras tu, em que pese
Estivesses encorpado de novo:
Abraçaste forte a todos então,
E deste-nos o teu receptivo sorriso.

Como gostas de ser tão terno,
buscando nos tranquilizar.
E, sim, como preza minha mente
em mostrar-se invulnerável.

Referência:

GUNN, Thom. The reassurance. In: BENSON, Gerard; CHERNAIK, Judith; HERBERT, Cicely (Eds.). Best poems on the underground. 1st. publ. London, EN: Weidenfeld & Nicolson, ‎‎2009. p. 111.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Elizabeth Bishop - O Banho de Xampu

Este poema é um texto de amor, uma homenagem direta de Bishop à sua amante brasileira, Lota de Macedo. Relacionado à realidade do envelhecimento, a poetisa se reporta ao fato de os cabelos de Lota começarem a apresentar sinais de envelhecimento em cinza.

Distintamente da tradicional poesia de amor, o avançar da idade e a sua manifestação nas cãs de uma pessoa não são temas evitados, mas enaltecidos ao se tornarem o centro focal da poesia. Com efeito, cabelos brancos transformam-se em metafóricas “estrelas cadentes”, um anúncio de perspectiva de futuro para essa relação.

Em “Flores Raras”, filme de Bruno Barreto que veio às telas em 2013, há uma cena que retrata as atrizes Gloria Pires, como Lota, e Miranda Otto, como Bishop, com esta a lavar com xampu os cabelos da primeira (vide foto abaixo).

J.A.R. – H.C.

Elizabeth Bishop
(1911-1979)

The Shampoo

The still explosions on the rocks,
the lichens, grow
by spreading, gray, concentric shocks.
They have arranged
to meet the rings around the moon, although
within our memories they have not changed.

And since the heavens will attend
as long on us,
you’ve been, dear friend,
precipitate and pragmatical;
and look what happens. For Time is
nothing if not amenable.

The shooting stars in your black hair
in bright formation
are flocking where,
so straight, so soon?
– Come, let me wash it in this big tin basin,
battered and shiny like the moon.

Cena do filme “Flores Raras” (2013)
Direção de Bruno Barreto

O Banho de Xampu

Os liquens – silenciosas explosões
nas pedras – crescem e engordam,
concêntricas, cinzentas concussões.
Têm um encontro marcado
com os halos ao redor da lua, embora
até o momento nada tenha mudado.

E como o céu há de nos dar guarida
enquanto isso não se der,
você há de convir, amiga,
que se precipitou;
e eis no que dá. Porque o Tempo é,
mais que tudo, contemporizador.

No teu cabelo negro brilham estrelas
cadentes, arredias.
Para onde irão elas
tão cedo, resolutas?
– Vem, deixa eu lavá-lo, aqui nesta bacia
amassada e brilhante como a lua.

Referência:

BISHOP, Elizabeth. The shampoo / O banho de xampu. Tradução de Paulo Henriques Britto. In: __________. Poemas escolhidos de Elizabeth Bishop. Seleção, tradução e textos introdutórios de Paulo Henriques Britto. Edição bilíngue. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2012. Em inglês: p. 212; em português: p. 213.

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Wagner Teixeira - Lira do Reacionário

De um jornalista e advogado pernambucano, cujas menções na internet são raras, trazemos este poema sarcástico que, ante o título que lhe foi atribuído – “Lira do Reacionário” –, bem poderia ser renomeado para “Lira do Coxinha”, de modo a atualizar os termos ao momento político ora vivenciado neste Pindorama (rs).

Afinal, o que pretendem os vendedores de amendoim ou balas, ou mesmo o engraxate? De onde o reacionário conclui: “os adolescentes costumam sonhar demais, principalmente os menores abandonados”. Que mente deturpada: decerto jamais terá ouvido falar em “desigualdade de oportunidades”!

J.A.R. – H.C.

Garoto Pobre
(Ken Hendricksen: pintor norte-americano)

Lira do Reacionário

Que quer afinal o vendedor de amendoim,
além de vender o seu amendoim?

Será que ele deseja ir à Disneylândia,
em viagem paga à vista,
com direito a carro no aeroporto,
hotel de cinco estrelas,
e uma loura divina
na recepção?

Que deseja o vendedor de balas,
além de melhorar a féria do dia?

Será que ele pretende
viajar num Concorde
acompanhado daquela assistente social
que freqüentou seus sonhos,
no dormitório do internato?

Que diabo imagina o engraxate,
além de meter um brilho
no pisante do freguês?

Será que ele espera
passar fim de semana em Cabo Frio,
dar uma olhada nas coxas das gatinhas,
(de perto, é claro)
e transformar a caixa de engraxate
num conversível vermelho,
para encantar a fantasia das garotas?

A verdade é que os adolescentes costumam sonhar demais,
principalmente os menores abandonados.

O Engraxate
(John George Brown: artista anglo-americano)

Referência:

TEIXEIRA, Wagner. Lira do reacionário. In: __________. Passatempo: poesias. São Paulo, SP: Alhambra, 1996. p. 33.

domingo, 23 de julho de 2017

Ellen Bryant Voigt - O Campo de Inverno

Em meio a um campo no inverno – onde reina a ausência quase absoluta de pessoas, dificultando a obtenção de auxílio –, a poetisa viu-se perdida, talvez submersa em águas geladas de um rio ou lago, e mal sentia o corpo entorpecido pelo frio, quando de lá foi resgatada, ou melhor, “fisgada”, e enrolada em cobertores até um lugar seguro.

Num passeio sobre esquis, no espaço entre o sanatório e a planície, Hans Castorp também se viu em momentos de apuro, quando a queda de neve se acirrou e ele teve de se valer de um abrigo improvisado num entreposto: tal episódio encontra-se narrado em um dos mais significativos capítulos de “A Montanha Mágica”, de Thomas Mann, denominado “Neve”. Confirme lá, internauta, se este poema não nos leva a associá-lo àquele incidente!

J.A.R. – H.C.

Ellen Bryant Voigt
(n. 1943)

Winter Field

The winter field is not
the field of summer lost in snow: it is
another thing, a different thing.

“We shouted, we shook you”, you tell me,
but there was no sound, no face, no fear, only
oblivion – why shouldn’t it be so?

After they’d pierced a vein and fished me up,
after they’d reeled me back they packed me under
blanket on top of blanket, I trembled so.

The summer field, sun-fed, mutable,
has its many tasks; the winter field
becomes its adjective.
For those hours
I was some other thing, and my body,
which you have long loved well,
did not love you.

Campo coberto de neve com grade
(Vincent van Gogh: pintor holandês)

O Campo de Inverno

O campo de inverno não é
o campo de verão esquecido sob a neve: é uma
outra coisa, uma coisa diferente.

“Nós gritamos, sacudimos você”, você me diz,
mas não havia som, nem rosto, nem medo, somente
ausência – por que não haveria de ser assim?

Depois de eles perfurarem uma veia e me fisgarem,
Depois de me terem feito tombar para trás, acomodaram-me
em baixo de cobertor sobre cobertor, tanto que eu tremia.

O campo de verão, nutrido pelo sol, mutável,
tem os seus muitos afazeres; o campo de inverno
converte-se em seu adjetivo.
Por essas horas,
eu era outra coisa, e meu corpo,
que muito tens amado por tanto tempo,
não te amava.

Referência:

VOIGT, Ellen Bryant. Winter field. In: McCLATCHY, J. D. (Ed.). The vintage book of contemporary ‎‎american poetry. 2nd ed. New York, NY: Vintage Books (A Division of ‎‎Random House Inc.), march 2003. p. 529.