Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 5 de maio de 2017

João Cabral de Melo Neto - Questão de Pontuação

O poeta pernambucano associa a cada sujeito a forma como pontua a própria vida: se há inúmeros pontos de exclamação, temos à nossa frente uma alma dionisíaca; se pontos de interrogação, antes um filósofo, mas agora um poeta; se a pontuação titubeia entre vírgulas e ausência de sinais, deparamo-nos com um político; e assim por diante...

Contudo, o emprego do ponto final não é bem aceito por ninguém, haja vista que é a inflexão capaz de dar termo a qualquer experiência de diferenciação em nossas vidas sobre a terra, de transformá-la em um ensaio válido ou não.

J.A.R. – H.C.

João Cabral de Melo Neto
(1920-1999)

Questão de Pontuação

Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);

viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política):

o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive
o inevitável ponto final.

Leitor da Natureza
(Vladimir Kush: artista russo)

Referência:

MELO NETO, João Cabral de. Questão de pontuação. In: __________. Agrestes: poesia (1981-1985). A “indesejada das gentes”. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1985. p. 146. (“Poesia Brasileira”)

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