Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 4 de maio de 2017

Claude Roy - O perguntador

Tantas inquirições no divagar do poeta sobre si mesmo e suas circunstâncias: pergunta-se ele sobre os porquês da existência, de tudo à sua volta, em especial das coisas que são capazes de manifestar o sopro vivificante.

Roy, em seu estilo claro e simples, brinca com as palavras e ideias, mesmo com o fato de estar vivo “sem ser convidado”, porque, sem mais nem menos, esqueceu-se das razões que levam às práticas de contar e sonhar, ou mesmo – quem sabe? – à vontade de ser e de estar.

J.A.R. – H.C.

Claude Roy
(1915-1997)

Le poseur de questions

Très loin, dans le dedans de mon écorce chaude,
dans le noir embrouillé des veines et du sang,
le poseur de questions tourne en rond, tourne et rôde:
il veut savoir pourquoi tous ces gens ces passants?

Le mort que je serai s’étonne d’être en vie,
du chat sur ses genoux qui ronronne pour rien,
du grand ciel sans raison, du gros vent malappris
qui bouscule l’ormeau et se calme pour rien.

Un cheval roux pourquoi? Pourquoi un sapin vert?
Et pourquoi ce monsieur qui fait une addition,
qui compte: un soleil, deux chiens, trois piverts,
qui compte sur ses doigts pleins de suppositions ?

Il compte sur ses doigts, mais perd dans ses calculs
sa raison de compter, sa raison de rêver,
sa raison d'être là, tout pesant de scrupules,
et d’être homme vivant sans qu’on l’ait invité.

Dans: “Poésies” (1970)

Os animais entrando na arca de Noé
(Jan Brueghel, o Velho: pintor flamengo)

O perguntador

Longe, bem dentro lá da minha casa quente,
na negra confusão das veias e do sangue,
roda o perguntador, roda e ronda em sua mente:
busca saber por que tanta gente passando?

O morto que eu serei pasma de estar em vida,
do gato no seu colo a ronronar por nada,
do céu tão grande em vão, da estulta ventania
que sacode o olmeiro e acalma-se por nada.

Por que um cavalo baio? E por que verde o abeto?
Por que aquele senhor a fazer adições,
a fazer conta: um sol, dois cães, três pássaros-pretos,
conta nos dedos cheios de suposições?

Conta nos dedos, mas nos seus cálculos perde
a razão de contar, razão de ter sonhado,
razão de estar ali, de escrúpulos inerte,
e de ser homem, vivo sem ser convidado.

Em: “Poesias” (1970)

Referência:

ROY, Claude. Le poseur de questions / O perguntador. Tradução de Mário Laranjeira. In: LARANJEIRA, Mário (Seleção, tradução e introdução). Poetas de França hoje: 1945-1995. São Paulo, SP: Edusp, 1996. p. 187.

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