Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Natal e Final de Ano - Boas Festas Dez.12


Prezado(a)s Internautas,

Venho trazer-lhes esta mensagem de fim de ano, talvez muito mais uma profusão de sentimentos desencontrados do que escritos de sóbria razão, mas de todo modo uma formulação de intenções pela busca do equilíbrio e de emoções humanas sob controle.

Penso que, até naturalmente, o melhor das intenções humanas sempre expressa, de algum modo, uma faceta do que é belo, ainda que este, em muitos casos, se manifeste de uma forma intangível, como a própria busca da verdade.

E, por isso mesmo, imagino que não concorde tanto com Salomão, no Eclesiastes, quando reduz a ação humana a uma sucessão de vaidades: torna-se necessário que o belo se manifeste, para que o homem possa ter paz de espírito!

Por que não usufruir o belo que existe nas pessoas - e esse belo tanto pode se expressar fisicamente quanto, e sobretudo, espiritualmente quanto -, se mais difícil ainda é ter que fechar os olhos e o coração para interpor barreiras a uma interação humana saudável e equilibrada?

Se vemos o mal em outrem, por que será que somos incapazes de percebê-lo em nós mesmos? Trata-se do mesmo mal: o malfeitor materializa a ação que, em nosso íntimo, perpetramos apenas num plano mental. Mas, certamente, infratores somos todos nós!

Há de se empreender uma viagem essencial ao cerne de nossa própria existência, para descobrir-nos as motivações mais profundas, aquelas que, uma vez expressas em nossas palavras e ações, evidenciam ao próximo a forma como se dá a nossa experiência com a beleza:    

O que procuraste em ti
ou fora de teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo...

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola,
essa ciência sublime e formidável,
mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular
que nem concebes mais,
pois tão esquivo se revelou
ante a pesquisa ardente em que te consumiste...

vê, contempla, abre teu peito para agasalhá-lo.

(Em A Máquina do Mundo - Carlos Drummond de Andrade)

Mas a experiência da beleza também se estende por outras dimensões do humano, servindo até mesmo para caracterizar-nos a natureza, uma vez que o belo faz parte da representação das obras de arte - e, aqui, faço explícita referência ao teor de um livro de Harold Bloom, intitulado "Shakespeare: A Invenção do Humano", em que o renomado crítico norte-americano perpassa a história das emoções humanas, retratadas nos textos do não menos famoso bardo.

Se isso não fosse pouco como referência, reproduzo o entendimento de um dos mestres da antropologia moderna sobre o mesmo tema:

Vistas na escala de milênios, as paixões humanas não se confundem. O tempo nada acrescenta e nada retira dos amores e dos ódios vividos pelos homens, dos seus compromissos, suas lutas e esperanças; antes e hoje são sempre as mesmas. Suprimir ao acaso dez ou vinte séculos de história não afetaria de maneira sensível o nosso conhecimento da natureza humana. A única parte insubstituível seria a das obras de arte que esses séculos viram nascer. Pois os homens não se diferenciam - e nem mesmo chegam a existir -, a não ser pelas suas obras. Como a estátua de madeira dada à luz por uma árvore, somente as obras proporcionam a evidência de que, no decorrer do tempo, alguma coisa realmente se passou entre os homens.

(Em Minhas Palavras - Claude Lévi-Strauss)

Entretanto, julgo que num mundo de miséria que assola grande parcela da humanidade, falar em usufruto da beleza para essas pessoas é como incidir em uma afronta acintosa. Decisões políticas equivocadas, permeadas de prepotência e arrogância, levam-nos a um convívio desigual e à manutenção de estruturas que oprimem os nossos irmãos - e digo, mesmo aqui, que irmãos são todos os outros seres humanos, para que o nosso juízo compreenda a amplitude de um amor-fraternidade-universal!

Mas, ainda nesse caso, poderemos fazer valer o belo, redigido em boa pena, para melhor elucidar a dicotomia da carência/abundância, referência tão preliminar aos economistas:

(...) A bastança e a indigência dependem, pois, da idéia que dela temos. A riqueza, como a glória e a saúde, só atrai e causa prazer na medida em que empresta prazer e atração a quem a possui. Estamos bem ou mal neste mundo segundo que pensamos: contente está quem se acredita contente e não aquele que os outros imaginam contente. Nossa crença é que faz seja ou não seja real a nossa felicidade!.

(Em Ensaios - Montaigne)

Por fim, apreciaria roubar apenas mais uma referência ao nosso poeta, para trazer à mente a principal de todas as dimensões humanas, a do amor incondicional, a daquele sentimento de que todos precisamos para alcançar a reconciliação com as coisas do universo, vivas ou não, qualquer que seja o estágio de evolução em que se encontram no momento presente:

Este o nosso destino: amor ser conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

(Em Amar - Carlos Drummond de Andrade)

Um grande abraço do sempre amigo,

J.A.R. - H.C.